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Nova Perspectiva sobre Reajuste Escalonado

  • Foto do escritor: Gustavo Trancho
    Gustavo Trancho
  • 24 de ago. de 2020
  • 6 min de leitura

Artigo de 24 de agosto de 2020


Este artigo tentar trazer a estimativa mais precisa acerca da viabilidade das demandas dos servidores do Distrito Federal acerca dos reajustes devidos desde 2015.


Situação até 2017

Logo após o descumprimento do reajuste escalonado previsto para 2015, centenas e centenas de julgamentos das Turmas Recursais dos Juizados Especiais do Distrito Federal julgaram que a atitude do governo era ilegal e que cumprir as leis vigentes era obrigatório, como exemplifica este julgado:

"8. Por fim, é de se ressaltar que a determinação prevista na Lei Distrital nº 5.249/2013 não é uma possibilidade a ser cumprida de acordo com interesses políticos ou dificuldades momentâneas. O seu descumprimento é um atentado injustificável ao Princípio da Legalidade, que, por sua vez, também garante a não aplicação da teoria da reserva do possível, até mesmo porque não vivemos em um Estado de Exceção, mas sim, em um Estado Democrático de Direito. A mera alegação de que o DF vive uma situação de exceção (?!), não é suficiente à permitir o afastamento da legislação democraticamente construída, através do processo legislativo instituído. 9. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO."(Acórdão n.1037499, 07056966320178070016, Relator: ASIEL HENRIQUE DE SOUSA, 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Publicado no DJE: 31/08/2017)
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Suspensão em razão da Repercussão Geral de Roraima

Sabendo da sua derrota em grande escala no âmbito local, o Distrito Federal habilmente obteve uma decisão monocrática do ministro Alexandre de Moraes foi proferida em 19 de outubro de 2017, suspendendo todos os processos sobre o tema.


A manobra processual decorreu da alegação de similaridade do caso do Distrito Federal com a Revisão Geral Anual das remunerações de Roraima, cuja repercussão geral havia sido reconhecida no Supremo Tribunal Federal. Esse tema já tratado em profundidade por em outro artigo.


Com o julgamento definitivo da Repercussão Geral 864 em dezembro de 2019, os processos suspensos poderiam voltar a ser julgados.


Situação em 2020

Com o retorno do julgamento do tema, as Turmas Recursais firmaram o entendimento de que o Tema 864 da Repercussão Geral cuidava exatamente do caso do Distrito Federal, o que permitiu a elas até mesmo retratar os julgamentos anteriores favoráveis.


Se antes havia mais de 600 julgados favoráveis, hoje há por volta de 700 novos casos publicados a partir do início de junho de 2020 nas Turmas Recursais dos Juizados Especiais, com resultado contrário aos servidores e conteúdo similar ao que se reproduz a seguir:

"JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO DISTRITAL. CARREIRA SOCIOEDUCATIVA. REAJUSTE ESCALONADO. LEI Nº 5.351/14. IMPLEMENTAÇÃO DA ÚLTIMA PARCELA. MATÉRIA DECIDIDA EM SEDE DE REPERCUSSÃO GERAL. PRELIMINAR DE SUSPENSÃO DO FEITO REJEITADA. TEMA 864 DO STF. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE AUMENTO DE VENCIMENTOS SEM PREVISÃO ORÇAMENTÁRIA. RECURSO CONHECIDO. PRELIMINAR REJEITADA E PROVIDO.
[...]
III. Estendem-se os efeitos do reconhecimento da repercussão geral do tema 864 do STF às ações em que se impugnam as leis locais que concederam reajustes aos servidores públicos distritais sem dotação orçamentária, em respeito aos princípios da isonomia e da segurança jurídica, inspiradores dos institutos de julgamento de causas repetitivas.
IV. O ato de concessão do aumento remuneratório sem observância das normas orçamentárias é nulo por imposição legal, dependendo de seu saneamento para produção de efeitos plenos." (Acórdão 1251088, 07103075920178070016, Relator: ALMIR ANDRADE DE FREITAS,  Segunda Turma Recursal, data de julgamento: 22/5/2020, publicado no DJE: 3/6/2020)

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Esperança do Servidor: Supremo Tribunal Federal

Para quem entrou nos Juizados Especiais, não há alternativa: a Constituição diz que não cabe recurso ao Superior Tribunal de Justiça. Por isso, o único caminho de reverter uma decisão contrária é recorrer ao Supremo Tribunal Federal, argumentando as linhas a seguir:

  1. o Tema 864 da Repercussão Geral julgou uma causa diferente do Distrito Federal, o que na jurisprudência anglo-saxã é chamada de distinguishing;

  2. a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal assegura ao servidor o direito adquirido ao reajuste futuro, em conformidade com a Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.013/TO, tal como exposto neste outro artigo;

  3. o julgamento da ação de improbidade contra o ex-governador Agnelo Queiroz teve uma perícia que confirmou que havia orçamento disponível no ano de 2015 e ele acabou absolvido;

Ocorre que, desde a Reforma do Judiciário de 2004 (a Emenda Constitucional 45), para ter um recurso extraordinário apreciado é necessário demonstrar que não é um caso que afeta apenas uma pessoa específica, mas que é um caso que transcende os seus próprios interesses e interessa a inúmeras outras pessoas, causando um impacto na sociedade. É o que se chama de Repercussão Geral.


Ninguém sabe dizer ao certo o que é exatamente a Repercussão Geral, mas quando há centenas ou milhares de causas com o mesmo tema, isso é um ponto que conta a favor do reconhecimento pela dimensão da questão. Por isso, foi feito um levantamento de quantos processos chegariam ao Supremo Tribunal Federal:


Estatística

O número de casos já julgados sobre o tema é superior a 1300, como uma pesquisa por alguns termos chaves demonstra:

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Com a tentativa de prever se esses mil e trezentos casos serão levados ao Supremo Tribunal Federal, foram analisados 100 (cem) dos processos julgados a partir de junho e que já tinha decorrido tempo suficiente para saber se houve recurso dos servidores derrotados. Muito embora sem um tratamento estatístico, é uma quantidade de processos (analisados um a um) que pode ser representativo do total.


Dos 100 processos pesquisados:


54 já haviam sido encerrados (53 por não ter interposto recurso, 1 por ter interposto um recurso ao Superior Tribunal de Justiça - incabível).


39 processos tinham embargos de declaração interpostos pelos servidores, um recurso normalmente apresentado como preparação para um recurso para Tribunal Superior (mas não há garantia de que todos eles irão recorrer para o Supremo Tribunal Federal)


7 já tinham interposto Recurso Extraordinário para o Supremo Tribunal Federal


Se 20% dos servidores recorrerem para o Supremo Tribunal Federal, é razoável acreditar que há uma chance significativa do reconhecimento da Repercussão Geral da discussão sobre as leis de reajuste do Distrito Federal, que afetam milhares e milhares de servidores.


Derrota Certa no Juizado Especial à Espera do Supremo Tribunal Federal

Para quem tem uma causa nos Juizados Especiais do Distrito Federal, com centenas de processos já julgados em sentido contrário, é praticamente certo que haverá derrota em 1ª e 2ª instâncias. Por isso, para ter chance de vitória, é necessário passar por essas duas instâncias, pagar custas e ser condenado em honorários sucumbenciais, para depois tentar reverter o julgamento no Supremo Tribunal Federal - cujo resultado é ainda incerto.


A tentativa de prever como julgarão os ministros do Supremo Tribunal Federal, inclusive com a previsão da aposentadoria deles e os riscos da mudança de composição, foi feita no artigo que descreve o precedente do Tocantins.

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Perspectivas fora do Juizado Especial

Enquanto os Juizados Especiais possuem milhares de ações julgadas, na Justiça Comum vê-se que ela não chega à casa das centenas.


Dentre as oito Turmas Cíveis que compõem o Tribunal de Justiça do Distrito Federal, duas têm precedentes atuais favoráveis aos servidores, argumentando justamente que a Repercussão Geral 864 não tem relação com o caso do Distrito Federal, mas seis delas seguiram a manada dos julgamentos que aplicaram a Repercussão Geral ao caso concreto. Não há como saber se essas turmas vão seguir a maioria ou se vão convencê-la ou, ainda, se a divergência prosseguirá, mas convém transcrever um dos precedentes mais eloquentes:

"CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PROCESSO CIVIL. GRATIFICAÇÃO DE ATIVIDADE TÉCNICO-ADMINISTRATIVA (GATA). CARREIRA DE ASSISTÊNCIA PÚBLICA À SAÚDE DO DISTRITO FEDERAL. TEMA 864 DO STF (RE 905.357/RR). TESE DEFINIDA. REALIZAÇÃO DE DISTINGUISHING. INAPLICABILIDADE.
[...]
O reajuste de vencimentos delineado pela Lei Distrital n.º 5.008/12, por meio da extinção gradativa da GATA, é direito subjetivo do servidor componente da carreira abrangida pelo comando legislativo, não sendo legítimo ao ente distrital afastar-se do compromisso estabelecido em lei sob o argumento de ausência de dotação orçamentária."(Acórdão 1269857, 0707466-51.2018.8.07.0018, Relator: MARIA DE LOURDES ABREU, 3ª Turma Cível, data de julgamento: 29/7/2020, publicado no DJE: 13/8/2020)

Como as Turmas Recursais são formadas por juízes e o Tribunal de Justiça tem suas Turmas compostas por desembargadores, que estão um passo além na carreira, é natural e esperado que as Turmas Recursais sigam os desembargadores (e não o contrário) - o que talvez explique porque essa divergência ocorre com naturalidade, mesmo depois de centenas de precedentes das Turmas Recursais em sentido contrário à decisão tomada já em julho.


De todo modo, faz sentido tentar um mandado de segurança que tramita pelas Varas de Fazenda Pública e pelo Tribunal de Justiça (fora do sistema dos Juizados Especiais), para ter a chance de ter seu processo distribuído a essas turmas onde os servidores são vitoriosos e porque o mandado de segurança praticamente não tem risco de sucumbência em honorários em favor dos Procuradores do Distrito Federal (o que pode atingir até 10% do valor da causa nos procedimentos que correm pelo procedimento comum).


Conclusão

Para quem entrou com uma ação de reajuste escalonado no Distrito Federal nos juizados especiais, as chances de vitória só existem se for feito recurso até o Supremo Tribunal Federal, com risco de pagar sucumbência de honorários advocatícios de pelo menos 10% do valor da causa.


Para quem entrou com uma ação de reajuste escalonado na Justiça Comum, as chances de vitória são maiores se o processo for sorteado para a 2ª ou para 3ª Turma Cíveis, segundo os últimos julgados disponíveis de cada uma das 8 turmas cíveis (o que pode mudar amanhã). De todo modo, mesmo se for vitorioso, é natural acreditar que o Distrito Federal levará a questão ao Supremo Tribunal Federal.


Como se vê, há bons argumentos para crer que a questão será decidida em definitivo pelo Supremo Tribunal Federal, cujo placar estimado com a composição atual, no artigo já citado, é de 7 a 4 a favor dos servidores. Entretanto, como é natural para qualquer pessoa que acompanhe os julgamentos na mais alta Corte do País, não é possível ter certeza nem de que o Supremo Tribunal Federal reconhecerá a Repercussão Geral da questão para decidi-la, nem qual será o resultado final do julgamento.

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